27 de junho de 2010

Dia de Futebol

O casal de namorados sentados no sofá, ela com cara de poucos amigos, ele com uma cara despreocupada que só homem sabe fazer, na televisão ligada, passava um jogo de futebol. Placar de um a zero.

- Não foi falta, não foi não. Esse juiz filho da mãe não vê um palmo a frente do nariz.
- Calma amor!
- Calma o quê? E ainda por cima dá cartão amarelo, ele deveria ter dado pro que se jogou. Agora isso, e se sai o gol?
- Você comemora, oras.
- Comemorar gol do outro time? Tá pensando o que, hein? Não vai ser gol não, o Marcão vai agarrar. Vamu Marcão, só tem você.

E o Marcão agarra, de longe dá para ouvir os gritos vindos daquela sala.

- Pênalti. Pênalti. – Voltam os gritos. – Esse juiz por acaso é cego? Foi claríssimo, olha o replay, olha. – Fala apontando. – Esse juiz só pode tá apitando outro jogo. Só pode!
- Mas por que foi pênalti?
- Porque o zagueiro do outro time derrubou o Diego na pequena área, não tá vendo?
- O Diego é o de vermelho?
- NÃO! O de verde, VERDE.
- Não precisa gritar. – Fala com certo mau humor. – Só fiz uma pergunta.
- Desculpe, é que nunca consigo me controlar nesses momentos, você sabe?
- Sei, sei. – Então teve uma idéia. – E se fôssemos jantar?
- Depois do jogo?
- Não! Agora.
- Agora? Mas agora eu tô vendo o jogo e tá ficando emocionante, a gente quase empatou naquele lance. E eu não saio da frente desta TV nem para tirar o pai da forca.

Calados os dois, ouve-se apenas o som da televisão. “Lateral batida diretamente para a área, Kleber tira com a cabeça, mas antes de ligar o contra-ataque, Léo Silva chuta a bola para lateral”.

- Vai ser sempre assim, não é?
- Assim como?
- Você me trocando por esse monte de homens suados.
- Você tá com ciúmes dos jogadores do meu time?
- Não é ciúmes, é... – Mas não conseguiu responder.
- É o quê?
- É sempre a mesma coisa. No domingo, quando eu quero sair, ir ao cinema, ao teatro, você diz que não, que tem jogo decisivo e não pode ir.
- Mas meu bem, nós não combinamos que cada um teria o seu espaço? Você inclusive adorou a idéia, disse que não queria ninguém pegando no seu pé.
- Eu sei. Mas o futebol não é mais o seu espaço e sim a sua prioridade.
- Isso não é verdade. Ah , o que é isso? Outro gol, dois a zero. Tá vendo o que você fez?
- Eu?
- É. Fica tentando discutir a relação na hora do jogo, claro que isso não pode acabar bem.
- Você está dizendo que se o seu time perder a culpa é minha?
- Sim. Se você não ficasse falando no meu ouvido essa historia de você gosta mais do seu time do que de mim e...
- Espera aí! Eu não falei que você gostava mais do seu time do que de mim.
- Não?
- Não.
- Mas você fica falando enquanto o meu time está perdendo, aí eu entendo tudo errado.
- Você não entendeu nada errado, só falou o que sentia. Sabe de uma coisa, Maria Eduarda, eu sou mesmo um otário, ficar aqui ao seu lado tentando entender esse jogo idiota enquanto você não me dá a mínima. Eu vou para minha casa ler Goethe, está me ouvindo?
- Goooooooooooooool! – Gritava ela. – Oi? O quê? Falou alguma coisa Vini? Vini, para onde você vai? Vini?

Por Hévilla Wanderley