7 de maio de 2010

De volta ao País das Maravilhas



“Alice No País das Maravilhas” (Alice in Wonderland, 2010), novo filme do monstro do entretenimento chamado Disney, é uma adaptação do livro homônimo, pelo aclamado diretor de cinema Tim Burton (Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet, O Estranho Mundo de Jack, Noiva Cadáver). Após meses e meses de espera e divulgação extrema em todas as mídias, a expectativa era gigante. Entretanto, ao olharmos a crítica especializada e até mesmo a opinião do público em geral, a palavra de ordem é decepção. Enquanto uma parte do público (sua grande maioria) espera ver na telona uma versão com atores do clássico da Disney, uma outra parcela (principalmente o público cult) queria mais fidelidade à obra original, até mesmo uma adaptação mais sombria, característica dos filmes do diretor.

Enfocando na personagem Alice, Burton põe a Wonderland como um reflexo do psicológico da garota. Enquanto pequena, a personagem era questionadora, abusada, e este País era uma representação de sua mente imaginativa. Já adulta, imatura e aborrecida com as convenções de uma sociedade machista, a antes bela terra se torna sombria e decadente. Ao adentrar nesse mundo e descobrir que seus sonhos de infância eram reais, ela amadurece e toma as rédeas de sua própria vida.

Tenhamos em mente que o filme não é “Alice”, seja do livro ou da adaptação da Disney, mas sim uma “continuação”, com uma Alice mais adulta, porém tão imatura quanto a Alice do livro, tornando sua segunda excursão pelo País das Maravilhas uma busca pelo amadurecimento. Com uma cena em flashback, explica-se toda a proposta do filme. “Está não é a Alice”, pelo menos não aquela Alice pequena do livro e do desenho.

O filme peca no roteiro, que não é repleto de reviravoltas e acontecimentos surpreendentes, mas o ponto de vista mais humanizado sobre a obra lisérgica de Carroll é o pulo do gato desta adaptação. O Chapeleiro Louco, numa boa, porém redundante, atuação de Johnny Depp, se torna melancólico diante de um não tão maravilhoso País, dominado pela cruel Rainha Vermelha, interpretada esplendorosamente por Helena Bonham Carter. A lagarta azul fumando narguilé e a Rainha Branca, atuação maravilhosa (porém injustiçada) de Anne Hathaway, que parodia seu próprio personagem, também merecem destaque.

Quando à parte técnica, o filme é indiscutivelmente maravilhoso. Utilização correta das cores – principalmente ao vermos o País devastado –, maquiagem impressionante, figurinos bem selecionados. O 3D, entretanto, contribui com muito pouco, justamente por ter poucas cenas visualmente impactantes.

A divulgação é a grande vilã da história. Ao ver trailers e cartazes do filme, esperamos ver uma adaptação direta do filme e do livro, o que não acontece. Assistir a esta adaptação de “Alice” requer um afastamento das outras, principalmente pelo número grande de licenças poéticas tomadas por Burton.

Particularmente, saí do cinema satisfeito. Esperava detestar o filme, por causa da enxurrada de críticas negativas, mas “Alice” de Tim Burton me agradou muito, já que nunca fui fã do desenho. Entretanto, entendo a divergência de opiniões. O que não me agradou foi a música-tema, que não encaixa em nenhum aspecto com o espírito do filme.

Por André Luiz Maia (@AndreLML)

Alice em “Underland”, visões de Tim Burton


Em abril deste ano estreou “Alice no País das Maravilhas”, de Tim Burton, um dos filmes mais esperados desde o seu anúncio, em novembro de 2007. Fãs dos filmes de Burton e dos livros “Alice no País das Maravilhas” e “Alice Através do Espelho”, do escritor Lewis Carroll, lotaram o cinema para assistir a adaptação.

Tim Burton tem em seu currículo filmes como “Edward Mãos de Tesoura” (1990), “O Estranho Mundo de Jack” (1993) e “Peixe Grande” (2003), que mostram o talento do diretor através de sua estética, que é umas das grandes características de suas películas, e do modo como recria os mundos de sua mente na telona, fazendo com que sejam sucessos de crítica e de público. Burton cuida dos detalhes de cada um dos seus filmes fazendo com que eles realmente tenham a sua marca, se tornando impossível não saber quando estamos assistindo um filme seu. Essas características fizeram com que os fãs do Carroll ficassem ansiosos pela adaptação.

No filme, Alice (Mia Wasikowska) agora é uma jovem de dezenove anos, que continua com a mesma grande imaginação e com os mesmos pesadelos de quando era criança. No início da narrativa, Alice está em uma festa da nobreza em Oxford, dada por Lord Ascot (Tim Pigott-Smith), ex-sócio do seu pai e agora dono das empresas que pertenciam a ele. Lá ela está prestes a ser pedida em casamento por Hamish (Leo Bill), filho de Ascot, na frente de todos os convidados. Sentindo-se acuada, Alice pede um tempo para pensar e vai até o jardim onde, ao ver o coelho branco, vai atrás dele fazendo com que ela caia em um buraco.

Quando chega ao chão se depara com uma sala oval onde existem várias portas, sendo uma delas bem pequena. Após isso ela observa que em cima da mesa que está a sua frente existe uma chave diminuta que abre aquela portinha. Mas ao tentar abrir percebe que mal passa a sua cabeça. Nesse momento ela vê um bolinho com uma inscrição “me coma”. Ela o come e quando o faz começa a crescer de maneira desenfreada até atingir proporções gigantescas, mas faz o caminho reverso ao beber de uma garrafinha que tem escrito “beba-me”, conseguindo assim passar pela porta. Em seu passeio pelo jardim, que ela encontra ao sair da sala oval, ela descobre que o lugar com o qual ela sempre sonhou existe, se chama “Underland”, e que ela é a escolhida para derrotar o Jabberwocky, monstro da Rainha Vermelha (Helena Bonham-Carter).

Como deu para perceber, o diretor usa os livros apenas como argumento para embasar sua história, onde Alice já não é uma criança e não existe o País das Maravilhas e sim o novo mundo, “Underland”. Nessa adaptação, a única coisa que realmente é fiel ao livro é a lebre que possui todo o comportamento insano e cômico do livro. As metáforas do crescimento e toda a carga filosófica e crítica do livro dão lugar à “jornada do herói” vivida por Alice, que agora não é a visitante de um mundo fantástico, mas sim sua salvadora. Essa transformação de Alice em uma heroína foi feita de uma forma muito solta, sem solidificar toda a trajetória pela qual a personagem percorreu até a batalha com o dragão, o que seria o ponto alto do filme, mas isso não acontece, deixando o filme sem emoção e sem um clímax.

Quando Helena Bonham-Carter, intérprete da Rainha Vermelha, aparece em cena, com seu cabeção e sua corte a tira colo, é com certeza um dos melhores momentos do filme. Boham-Carter é uma atriz maravilhosa, consegue unir o caráter egoísta, imperativo, cruel e cômico da personagem fazendo de forma tão magistral e carismática que roubou o filme fazendo com que ela se sobressaísse à personagem principal.

Os personagens perderam sua insanidade e no filme foram humanizados, o que era um propósito de Burton. Um dos personagens que para mim sofreu essa mudança de forma mais clara foi o Chapeleiro Maluco, que agora é só um homem que esconde através de uma pretensa loucura a tristeza e desesperança de alguém que perdeu tudo o que tinha quando a Rainha Vermelha rouba o reino de sua irmã, a Rainha Branca (Anne Hathaway). Depp consegue passar todo o sentimento do personagem, faz com que você acredite nele e veja a mudança da tristeza (mesmo que disfarçada) em felicidade no final.

Mia Wasikowska (Alice) não é uma má atriz, mas não possui presença em cena o suficiente para se impor na tela junto com tantos bons atores e personagens fortes, o que faz com que ela pareça apenas uma garota perdida em um mundo desconhecido. Mesmo em cenas com a Rainha Branca (Anne Hathaway), que é um personagem marcante, mas sem uma carga dramática como a da Rainha Vermelha e de outros personagens Wasikowska ainda é ofuscada.

O filme possui uma fotografia muito bonita, com uma paleta de cores nas quais os tons mais quentes se sobressaem no azulado, que predominou como “pano de fundo” do filme, e uma caracterização feita de maneira precisa, porém falhou na construção da trajetória percorrida por Alice para se tornar uma heroína, tirando a emoção do filme e fazendo com que o espectador saia da sala do cinema com uma sensação de que foi só mais um filme.

Por Gemma Lima (@escreviecorri)

A volta de Alice a um País não tão maravilhoso assim


Nota: Devido à estreia de "Alice No País Das Maravilhas", três de nossos membros, Kill, Gemma e André, se interessaram em escrever sobre as impressões que tiveram acerca do filme. Logo, preparem-se para uma overdose de Alice!

Quando a Disney anunciou no fim de 2007 que faria uma adaptação em live-action de Alice no País das Maravilhas, e que Tim Burton seria o responsável pela direção, muita gente comemorou. Diretor de filmes como Beetlejuice (1988), Edward Mãos de Tesoura (1990) e mais recentemente Sweeney Todd - O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet (2007), Burton era a escolha perfeita para dar vida ao mundo de Alice. Sua capacidade e competência para criar mundos fantásticos, como em Peixe Grande (2003) e A Fantástica Fábrica de Chocolates (2005), seu estilo de direção e estética peculiar, que se transformou em sua marca registrada, e a habilidade em contar histórias prometiam fazer jus ao imaginário de crianças e adultos.

Nascido em 1958 em Burbank, Califórnia, lar de grandes estúdios como NBC, Warner Bros. e Disney, Tim Burton começou sua carreira na equipe de animação dos estúdios Disney em 1979, após se formar no Instituto de Artes da Califórnia. Foi nessa época que criou os conceitos do que depois viria a ser O Estranho Mundo de Jack (1993), Vincent (animação de 1982 em homenagem ao seu ídolo, o ator Vincent Price) e Frankenweenie (1984). Este último lhe rendeu sua estréia como diretor no ano seguinte, em A Grande Aventura de Pee Wee, que faturou 40 milhões de dólares nos cinemas americanos. A partir daí, o estilo característico de Burton caiu nas graças do público e dos estúdios, e vários sucessos se sucederam, como Batman (1989) o já citado Edward Mãos de Tesoura, considerado pelos fãs do diretor como seu melhor trabalho até hoje.

A adaptação do clássico literário escrito em 1865 por Lewis Carroll - pseudônimo do matemático e escritor inglês Charles Lutwidge - é uma das mais esperadas estréias do ano. O livro que povoa o imaginário popular há décadas já teve várias adaptações para cinema, sendo a mais conhecida a animação da Disney de 1951. Nessa nova versão, Tim Burton usa uma espécie de mistura dos dois livros que contam a aventura de Alice pelo País das Maravilhas para criar seu próprio argumento - a continuação do primeiro livro se chama Através do Espelho e foi publicada em 1972.

O filme de Burton apresenta uma Alice mais velha, que herdou do pai, agora morto, a imaginação fértil e a curiosidade. Quando criança, tinha sonhos recorrentes sobre um certo lugar que conheceu após cair na toca de um coelho. Agora, aos dezenove anos, Alice (interpretada pela australiana Mia Wasikowska) descobre estar prestes a ser pedida em casamento, quando vê um coelho branco e resolve seguí-lo, caíndo num buraco fundo que a leva à Underland. Logo ela descobre que essa é a terra dos seus sonhos de infância e que já esteve por aqui. As coisas, porém, estão diferentes: a Rainha Vermelha (Helena Bonham-Carter) comanda o País com mão-de-ferro, após roubar o trono de sua irmã, a Rainha Branca (Anne Hathaway), e uma profecia trazida pela lagarta azul revela que Alice deve matar o mostro Jabberwocky e salvar os habitantes de Underland.

Nesse mundo novo, personagens clássicos ganham nomes (a lagarta é chamada de Absolem e o coelho branco de McTwisp) e perdem em fidelidade à obra original. A história de Burton segue a clássica jornada do herói e transforma Alice numa espécie de Messias, que passa por uma jornada de autoconhecimento durante o filme para culminar na descoberta de si mesma em meio à batalha final contra o Jabberwocky.

O trunfo do filme é a Rainha Vermelha, magistralmente interpretada por Helena Bonham-Carter, que rouba todas as cenas em que aparece. A Rainha Branca é uma caricatura do estereótipo da boa princesa e o Chapeleiro Maluco (Johnny Depp), no fim das contas, não é assim tão louco. O personagem mais fiel ao livro é o coelho branco, que consegue manter o tom dado por Carroll. O problema é que tentativa de humanizar demais os personagens acabou descaracterizando-os, tirando a loucura original que os deixava tão interessantes e servia como canal introdutor para as críticas sociais, filosóficas e metáforas sobre o ser humano que existem nos livros de Carroll. Alice deixou de ser apenas uma garota em busca de aventuras conhecendo um mundo diferente e passou a ser uma heróina sem motivações sólidas, apenas porque esperam que ela salve o dia, defeito agravado pela interpretação de Wasikowska, que, apesar de ser boa atriz, se perde em meio a tantos nomes de peso e não consegue impor sua presença.

Ao final do filme, o que se percebe é que vimos Alice de Tim Burton, que criou a partir do argumento de Lewis Carroll uma história inteiramente sua, que pouco tem a ver com a original, uma espécie de fanfiction. Entretando, isso não é de todo ruim, se você olhar pelo ângulo correto. Para os fãs de Burton, todos os elementos que caracterízam o diretor estão lá: o mundo e as criaturas fantásticas, visual impecável, a ênfase nas histórias dos personagens e os flashbacks, o tom sombrio e a paleta de cores vivas em contraste, o amor pelos desajustados. O diretor conseguiu, da sua própria maneira, entregar um trabalho competente, que prende a atenção e que com certeza agradará a maioria dos espectadores. O grande porém é que ele poderia ter sido bem melhor do que apenas uma tentativa válida.

A impressão que fica é de que se viu um filme razoável e divertido, mas sem nenhum diferencial, o tipo de filme que se esquece logo após a sessão. A dica é: vá ao cinema sem altas espectativas e sem esperar a tradução das obras na tela grande. Burton, mais uma vez, cria o seu próprio mundo; o de Carroll vai ter que esperar.

Por Kill (@kill707)

5 de maio de 2010

O futuro do cinema pós-3D


Assistindo ao Oscar 2010, a grande discussão girava em torno de dois filmes: "Guerra Ao Terror", de Kathryn Bigelow, filme quase documentário sobre a Guerra no Iraque, com duras críticas ao governo americano; e "Avatar", de James Cameron, quase um ode ao visual, com a incrível técnica de filmagem em três dimensões, atores interagindo com os cenários construídos por computação gráfica em tempo real, dando a sensação impressionante de realismo. Quem receberia o Oscar de Melhor Roteiro? E de Melhor Filme? Para muitos, seria algo decisivo para o futuro do cinema. Afinal, o que se prezaria a partir de agora? Filmes com roteiros inteligentes e bem desenvolvidos, ou apenas uma enxurrada de belas explosões e pirotecnias aleatórias?

Para começar, a discussão é infundada. Quando o cinema colorido e até mesmo o sonoro surgiram, questionamentos semelhantes foram pontuados, e o que vemos hoje é o que o cinema sempre foi, e sempre será: formas diferentes de se contar uma história. Desde o cinema-espetáculo, promovido massivamente por Hollywood, ao dito cinema-arte, ambos têm abordagens, objetivos e públicos diferentes. Não seria com o surgimento do 3D que bons roteiristas e diretores sucumbiriam ao apelo visual. O 3D surge como uma ferramenta que pode ampliar os horizontes narrativos, sendo um artifício extra para contar, de forma cada vez mais contundente, uma história, um universo ficcional.

Por fim, filmes com pouca profundidade de roteiro, prezando pelo visual sempre existirão, com ou sem a chegada do 3D, que é apenas uma tecnologia nova, como foi o chroma-key. O que devia realmente ser questionado é como utilizar essa nova ferramenta de maneira a enriquecer a arte de se fazer cinema.

Por André Lima (@AndreLML)