5 de junho de 2010

Profissão de Risco

Que uma mulher é um ser engraçado, ninguém duvida, mas uma mulher em uma loja de roupas chega a ser aterrorizante... para o vendedor.

– Não, essa não. Aquela. – fala Clotilde, apontando para uma blusa de bolinhas que está no manequim.
– Essa a senhora já provou e disse que não ficou bem, não se lembra? – pergunta o vendedor paciente.
– Mas essa é diferente. Não vê que ela é maior, aquela outra me deixava mais gorda. – explica a senhora que aparenta ter uns quarenta anos e está um pouco fora de forma.

Pacientemente o vendedor tira a blusa do manequim e entrega para Dona Clotilde, que a coloca embaixo do braço e sai para o provador. Meia hora depois ela volta. Então, o vendedor pergunta:

– Como ficou?
– Péssima! Essa me deixou mais gorda do que a outra.

“É porque a senhora é gorda!”, pensou o pobre vendedor, mas nada disse. Ele analisou a situação e perguntou se ela não preferia um pretinho básico. Preto sempre deixava as pessoas mais magras. Ela aceitou a proposta e começou mais uma busca do vendedor, agora por blusas pretas.

– Não gostei dessa, ela é muito decotada. Essa também não, a malha é muito fina, o inverno tá chegando, sabia? Vou experimentar essa. – Disse ela, segurando uma de gola e mangas compridas, saindo novamente para o provador.
– E então? – Disse o vendedor assim que avistou a senhora sair do provador, rezando para que tudo terminasse logo.
– Ficou perfeita! Você tinha toda razão meu filho, preto sempre nos deixa mais magra.
– Que bom! A senhora vai pagar no cartão ou...
– Espere um pouco.
– O quê, o que foi? – Perguntou o vendedor apreensivo. O medo começava a dominá-lo, suas mãos suavam, suas pernas tremiam e o coração disparado lembrava o dia que ele tinha conhecido os pais da primeira namorada.
– Estou pensando em levar uma calça também, o que acha?

“Que a senhora deveria ir embora!”, pensava ele, enquanto sorria amarelo para Dona Clotilde, que lhe devolvia o sorriso.

– Vamos, é por aqui que fica a seção das calças. Que tipo de calça a senhora quer?
– Não sei ainda.

O vendedor mostrou todas as calças que cabiam nela, de diversas cores e formatos, subiu prateleiras, foi buscar no estoque interno, andou pela loja, pediu informações ao gerente, mas nada, nenhuma conseguiu agradá-la.

– Sabe de uma coisa, meu filho? – Disse Dona Clotilde para o coitado do vendedor, que esperava um novo bombardeio. – Já que não tem nenhuma calça, acho que também não vou levar a blusa. Talvez um vestido fique bem em mim. Aonde fica a seção de vestidos mesmo?
– Já chega! – Gritou ele. Todos que estavam na loja ouviram e viraram para ver o que estava acontecendo, ele arrancou a blusa das mãos dela e a rasgou de cima a baixo. – E agora, cabe na senhora, não? – Ele rasgou mais uma vez e gritou. – E agora? – Jogou a blusa rasgada no chão pisou em cima, agora já não importava mais, seria demitido e sairia feliz, não atenderia mais ninguém nessa vida, nem a própria mãe.
– Meu filho – chamou a senhora – No que está pensando?
– Em nada, em nada. – Respondeu o vendedor, acordando do seu devaneio. – É por aqui, venha comigo.
– Você sabe dizer se tem algum de cor verde-mar? – Inquiriu ela, e o vendedor balançou a cabeça positivamente.
– Quem diz que um vendedor de loja não tem vida agitada é por que nunca atendeu uma mulher. – Disse ele baixinho.
– O que foi que disse, meu filho?
– Por aqui. Por aqui.

Por Hévilla Wanderley

Um comentário:

  1. Deyse Plácido05 junho, 2010 23:08

    Não sei porque, mas essa Dona Clotilde me parece tão familiar....

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