15 de agosto de 2010

CMCCCC

O que Dona Marieta mais gostava de fazer era falar e seu assunto favorito era a filha Marcelinha.
– Loira, alta, magra, tem um narizinho levemente arrebitado, perfeita. – dizia ela para a sua vizinha. – Perfeita para ser modelo. Eu sempre sonhei em ser modelo. – confessava. – Mas não pude, não cresci muito como a senhora pode ver, mas Marcelinha puxou ao pai e cresceu muito, mal fez quinze anos e já está com seus um e setenta, e bonita como é... Não vejo a hora de vê-la na passarela.
Marcelinha realmente era muito bonita, mas não queria saber de ser modelo, não era o que sonhava para si. “Por que a mãe era assim?” Era o que sempre se perguntava. Não gostava da maneira como a mãe queria impor o seu sonho antigo de adolescente sobre ela. O que ela queria era outra coisa...
– Casar?
– É casar.
– Com quem?
– Como o Otávio Augusto.
– Mas vocês mal completou quinze anos.
– Eu não vou me casar agora. Vou esperar completar dezoito e então caso!
– Mas minha filha, você é tão bonita tem tudo pra ser uma modelo de sucesso, até nome de modelo você tem, Marcelinha Montez, você não pode fazer isso, não pode se casar.
Mas Marcelinha não ouviu a mãe e se casou, não com o Otávio Augusto, ele já era passado, casou-se com o Luiz Otávio e teve uma filha: Maria Clara, tão bela quanto ela, principalmente depois que cresceu. Arrancava suspiro de todos os garotos da escola e quando entrou na faculdade arrancou suspiros por lá também.
– Então filha. – Falava Dona Marcelinha. – Quando pensa em se casar?
– Casar eu?
– É, ainda não nos trouxe nenhum namoradinho aqui, aquele rapaz, o Flávio, bonito ele, por que você não o convida para jantar?
– Não acho uma boa idéia.
– Por quê?
– Porque não, além do mais eu não pretendo casar.
– Como assim não pretende casar? Que moça de família não quer casar?
– Eu. E muitas outras que fazem parte da CMCCCC.
– CM o que?
– CCCC.
– E o que significa isso?
– Clube das Mulheres Contra o Casamento e o Consumo de Carne. Nós não somos apenas contra qualquer tipo de matança indevida e defensora dos animais, mas também contra o casamento, essa forma falida do homem tentar inibir e apequenar a mulher. Homens nunca mais. Não precisamos deles, tudo o que eles podem fazer, faremos melhor, tudo o que eles pensarem em criar, criaremos melhor e tudo o que eles...
– Mas, mas... E netos, você me prometeu netos não se lembra?
– Claro mamãe. A CMCCCC permite que tenhamos produções independentes.
– Produções o que?
– Independentes. Podemos ter nossas próprias filhas sem nenhum problema e sem precisarmos casar, não é ótimo?
A mãe não sabia o que dizer, nunca ouvira tamanho absurdo, uma mulher que não quisesse casar. E ainda por cima queria ter um filho sozinha, o que os vizinhos não iriam falar? Era o fim, era o fim.
– A culpa é sua Luiz Otávio. – Dizia ao marido. – Você que não deixou quando a mamãe quis colocá-la naquela agencia de modelos. Ela é loira, alta, magra, tem um narizinho levemente arrebitado, perfeita. Até nome de modelo ela tem, Maria Clara, era só colocar o sobrenome do marido e o sucesso era garantido.

Por: Hévilla Wanderley

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